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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Començando lição de Gálatas

Owo! Que propício essa lição sobre Gálatas. Falar sobre lei, liberdade, culto, ritos, missão e tensão. Vamos continuar donde deixamos no último comentário sobre adoração na igreja primitiva. No último texto investiguei a mudança teológica que a vinda de Jesus trouxe aos judeus-cristãos. E com essa mudança o que foi modificado no culto, salvação e missão.
Centrais à essas mudanças estão Paulo, Estêvão, Pedro, Cornélio e o concílio de Jerusalém.  Escrevi anteriormente que:
“na prática o que Tiago deixou claro é que os costumes judeus da época não deveriam ser padrão para todos. Mas que deveriam ser mantidas os princípios de culto gerais do Antigo Testamento que envolve tanto Israelitas como estrangeiros, como Levíticos 17-19. ...Parece que os cristãos da época de Paulo demoraram para entender tais ideias. No livro de Gálatas e Romanos Paulo continua a debater sobre tais assuntos. E em Atos 18, em sua segunda viagem missionária, após o relato Lucano do concílio de Jerusalém,  encontramos Paulo debatendo novamente esse assunto.”
O que deveria continuar ou não nos rituais do santuário em relação a vinda de Jesus Cristo? Qual a importância e relevância da lei ou leis do Pentateuco após o Messias? Sobre essas importantes questões aprenderemos ainda mais nesse trimestre. Mas, como sempre, nesse tipo de estudo focando em um livro a lição da escola sabatina começa com uma introdução histórica sobre o autor.
O papel de Jesus nisso tudo
Já vimos que a vinda de Jesus mudou os paradigmas de muitos judeus. É importante entendermos essas mudanças à luz do livro de Atos, pois é sobre essa mudança que Paulo escreve o livro de Gálatas. Mas isso veremos nas próximas semanas.
O livro de Atos começa onde o evangelho de Lucas termina. O último capítulo de Lucas é sobre a ressurreição de Jesus (v.1-12), o diálogo de Jesus no caminho para Emaús (v.13-35), a aparição aos apóstolos (v.36-49), e sua ascenção (v.50-53). Que a ressureição ocorrida no domingo é algo espetacular, fisicamente falando, e dispensa comentários. Mas relacionado a um Messias morto como um criminoso é ainda mais, teologicamente falando.
Tanto que como bons judeus, os dois discípulos que  voltaram tristes das festividades pascoais aos seus lares questionaram a identidade de Jesus. E de acordo com Cleopas, Jerusalém inteira fazia o mesmo questionamento (v.18). “Ora nós esperávamos que fosse ele quem havia de redimir a Israel; mas depois de tudo isto, é já este o terceiro dia desde que tais coisas sucederam.”
“Ele quem havia de redimir a Israel”. O que eles estavam dizendo? Para cristãos quase 2 milênios depois, tal pergunta parece ser tão simplória. Por causa de nossa rica tradição evangélica (dos Evangelhos-Novo Testamento), a salvação pela morte de Jesus é segunda natureza. Mas para judeus do século 1 não era bem assim. O que envolvia a redenção e qual a relação com Paulo, Pedro e o livro de Gálatas?
A tradição judaica  contava a seguinte história: há milhares de anos atrás o Deus Todo-Poderoso resolve criar o universo, e dentre eles o planeta com animais e seres humanos. Todos teriam vida sem fim se confiassem em Deus, obedecendo-o. A ordem era clara, não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal. Ouvindo a serpente Eva e seu esposo viraram as costas à ordem divina e criaram suas próprias realidades.
No final das contas, eles descobrem não somente que estavão nus, mas também que Deus estava certo e a serpente errada. Descobrem também que Deus dá uma segunda chance por meio do sacrifício de uma animal cuja pele os cobre. Mas não somente isso, eles aprendem que esse sacrifício seria um descedente da mulher, e que guerrearia contra os descedentes da serpente e finalmente destruiria o pecado (Gn.3:15).
Apesar de Eva esperar ser Caim o tal descedente, sua esperança foi parcialmente frustrada. Mas não fora somente Eva que se decepcionou com a esperança dada pelo Criador. Com poucos detalhes sobre tal salvador, Deus apenas havia informado Eva que seria um descendente, não o primeiro, nem quando, ou onde. Nos filhos de Noé Deus afunila sua predição, limitando tal promessa aos filhos de Sem (Gn.10:27). Com Abraão e Davi mais detalhes são adicionados.
Com Abraão a salvação da humanidade ganha contornos específicos. Em Gn.12 a salvação do mundo se torna bem familiar, “em ti serão benditas todas as famílias da terra.” Pelos filhos de Abraão viria o descendente esperado. E junto com a salvação uma terra e uma nação. Para aqueles dois judeus de Emaús ser judeu era fazer parte do único povo divino. Mas sobre o fim do pecado... anos vão e vem, Jacó, José, Moisés e nada de fim do pecado, pelo contrário, coisas parecem só piorar.
Com Moisés e a saída do Egito, os descedentes de Abraão ganham status de povo escolhido de Deus, uma nação de sacerdotes, povo santo. Mas a promessa é condicional, como foi no Éden . “Se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança, então...”  Depender de Deus obedencendo aos Seus mandamentos, além da escolha soberana divina os tornava meios por quais todas as famílias da terra seriam abençoadas.
Centenas de anos passam, coisas ruins acontecem assim como coisas boas, mas nada do esperado descedente aparecer. Israel decide ter um rei. Por meio do segundo rei, Davi, Deus revela a Seu povo novamente Sua promessa, com mais detalhes sobre o tal descendente. Ele será o filho do Rei Davi, e estabelecerá o reino de Israel para sempre (II Sm.7:8-17).
Certamente a princípio Salomão criou grandes espectativas na mente dos Israelitas. Como Eva e os dois discípulos a caminho de Emaús tal esperança se tornou rapidamente em grande decepção. Caim, Salomão e Jesus morreram e a vida contiuava a mesma, quer dizer, pior porque Deus ainda não cumprira Sua promessa.
Promessa essa que fora detalhada ainda mais com os profetas. Não afirma Isaías que o renovo de Davi destruiria os inimigos de Israel?! E que Ele purificaria Jerusalém de toda imundícia e resplandeceria em glória, reinando para todo o sempre!? Trazendo de todas as nações da terra o restante de Seu povo para reinar juntamente com eles (Is.4,11, 65 e 66)?!

Como conciliar tais profecias sobre um reino eterno com um filho de Davi  que morreria mas que reinaria para sempre e destruiria todos os inimigos políticos?


Com toda essa tradição em mente, e com grandes esperanças instigadas pela pregação de João Batista e os ensinos e milagres do carpinteiro de Nazaré, milhares de judeus esperavam ser Jesus, o Cristo. Mas esse Jesus, a quem esperavam ser o que redimiria a Israel, morrera já fazia 3 dias, e os opressores romanos continuam como antes. Mais uma decepção! Porém note a resposta de Jesus.

“Ó néscios e tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram! Não convinha que Cristo padecesse e entrasse na sua glória?” (Lc.24:25) Qual foi a parte que Jesus afirmou ser ignorada pelos discípulos? A morte e a glorificação do Messias.  Is.53, junto com a parte da ferida do calcanhar do descedente, à luz do sacrifício no santuário não entendida.
Essa falta de entendimento não era de todo estranha, penso. Como conciliar tais profecias sobre um reino eterno, com um filho de Davi que reinaria para sempre e destruiria todos os inimigos políticos com alguém que morreria? Essa conciliação entre santuário, sacrifício e salvação não era bem explicada na mentalidade judaica aparentemente.
E mesmo depois da explicação de Jesus aos dois naquele domingo, e em seguida ao restante dos discípulos em Jerusalém, tal assunto não fora resolvido completamente. Isso demoraria anos, posso até dizer milênios, se considerarmos que nem todas as implicações de tal mensagem fora explicada no cristianismo.
Quando Paulo entra nessa história
A tentativa de resolução desse problema é percebida claramente (mas não somente) na história de Cornélio e Pedro, e em seguida Paulo com sua viagem missionária e o Concílio de Jerusalém. Ambas histórias se relacionam com a história de Estévão de alguma maneira.
Já vimos que o judeu de origem grega (heleno ou da diáspora), Estêvão, movido pelo Espírito Santo discutia as Escrituras com judeus em Jerusalém. De acordo com Lucas alguns entenderam Estêvão como os sacerdotes entenderam Jesus, falando contra o lugar santo e a sua lei. Contra o santuário e seus ritos. Como não temos o que Estêvão falou, devemos buscar o que Jesus afirmou sobre o assunto.

Essa conciliação entre santuário, sacrifício e salvação não era bem explicada na mentalidade judaica aparentemente.


Em João 2, ao remover os comerciantes do pátio do templo, Jesus afirmou que destruiria o santuário em três dias e o reconstruiria. Sobre essa base o sumo-sacerdote acusa Jesus e o mata. Mas João explica que Jesus se referia ao Seu corpo. Se Jesus disse ser Seu corpo o santuário, e João Batista O chamou de Cordeiro de Deus, podemos deduzir algumas coisas.

Primeiro, a morte de Jesus destruiria de alguma forma o templo. Segundo Ele era o cumprimento da promessa do sacrifício de Deus em Gn.3 e que dava significado ao santuário. Assim, à luz de Is.53, o Cristo daria fim/finalidade aos rituais do santuário, providenciando salvação a todos por meio de Sua morte vicária. Não eram esses os elementos que Jesus afirmava faltar nos discípulos de Emaús? Parece que com Estêvão os cristãos estavam aprendendo tal relação.
Relação essa que inclui Paulo na história desse entendimento. Pois ele é visto na cena do debate e crime de Estêvão (At.8:1). E após a sua conversão é relacionado também com o mesmo grupo de Estêvão, os judeus helenistas (9:29). E é Paulo ,que por meio de sua perseguição aos cristãos em Jerusalém, espalha-os para pregar o evangelho (8:1-8). Note que Felipe é o primeiro relato de pregação fora do ciclo de Jerusalém. E depois temos Paulo em Damasco e Pedro em Jope.
Nesse ponto a relação entre cristãos-judeus e gentios estavam se estreitando. Não que isso não ocorria. Era normal um judeu conviver com outras pessoas, falar de sua religião a elas e até aceitá-las como judeus conversos. Mas tal conversão incluia, no caso masculino, circuncisão e participação nos ritos do templo. Pois essa era a marca dos escolhidos filhos de Abraão. Aos que não queriam a circuncisão, prática abominada pelos romanos, mas que adoravam o Deus de Israel e participavam do culto na sinagoga, os judeus consideravam tementes a Deus.
Mas na visão do lençol e no encontro com um temente a Deus essa visão seria desafiada. Em At.10 Deus deixa claro a Pedro que gentios eram também povo de Deus. E com a presença do Espírito Santo em Cornélio e sua família, Pedro reconhece que mesmo sem circuncisão os que creem em Jesus como Cristo (o descendente da promessa) são aceitos e salvos por Deus.
Ao ouvir essa e outras histórias de gentios incircuncisos recebendo o Espírito, judeus-cristãos de Jerusalém (não helenos) intimam Pedro a se explicar (11:1). Ao contar sua experiência, Pedro iguala a experiência de conversão de tais gentios com a dos apóstolos em Jerusalém com base no Espírito, e não no rito de cortar parte da pele do pênis.
“Quando comecei a falar, caiu o Espírito Santo sobre eles, como também sobre nós, no princípio...Pois se Deus lhes concedeu o mesmo dom que a nós nos outorgou quando cremos no Senhor Jesus, quem era eu para que pudesse resistir a Deus?” (v.15,17)
O resultado é positivamente aceito pela igreja em Jerusalém, mas o livro de Atos e de Gálatas revelam que a aceitação não foi unânime. Esses da “circuncisão”, alguns indificados por Lucas como fazendo parte da “seita dos fariseus” (15:5), outrora grupo de Saulo, levantam a questão novamente, agora com uma aceitação ainda maior de gentios com a pregação de Paulo.
Note que a questão é a mesma, ainda não compreendida por toda a igreja. A relação entre salvação e, na linguagem de Lucas, “o costume de Moisés” (v.1).  Qual o papel da lei de Moisés e dos rituais judaicos ordenados por Deus como símbolo do povo santo com a vinda de Jesus, o Cristo? O fato é que o concílio de Jerusalém decide que os gentios são aceitos pela igreja sem o rito da circuncisão, mas
que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do sangue, da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitasç destas coisas fareis bem se vos guardardes.”  (v.29)
Mas novamente, como no caso de Pedro e Cornélio, a aceitação estava longe de ser unânime e resolver o problema de uma vez. Isso porque, o que me parece, teologicamente a igreja cristã da época  ainda não tinha refletido suficientemente sobre as implicações da vinda, morte e ascenção de Jesus como Messias.
Comunicação divina dessa semana: É isso que Paulo faz em Gálatas, livro de nossa reflexão esse trimestre. O que aprendi com essa semana é que nem sempre é fácil desvencilhar de nossas tradições, principalmente se elas estão baseadas de alguma forma na Bíblia. Mudança na igreja requer tempo, missão e abertura para discussão. Creio que a Igreja Adventista e o Cristianismo em geral fariam bem se envolvessem mais em missão e discutissem abertamente as implicações da Pessoa de Cristo na estrutura da igreja e na salvação de toda a humanidade.

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