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sábado, 19 de fevereiro de 2011

O primeiro dia da criação afirma que Deus criou a luz, e no quarto o sol, lua e estrelas. Como conciliar tais informações?

O Salmo 104, uma repetição estilizada da história da criação em Gênesis 1, segue a mesma seqüência dos dias semanais e suas respectivas criações. E no paralelo com o primeiro dia o salmista afirma (no v.2) que Deus estava coberto com luz, como uma veste. Assim, pode ser inferido que a luz do primeiro dia era a própria presença de Deus que por diversas vezes se manifestou luminosa na história (e.g. Gn.15:17; Ex.24:10; 40:34-38), dividindo até a luz e as trevas, como na coluna de nuvem no deserto em Ex.14:19,20.

Outra possível explicação vem a partir da estrutura literária de Gênesis 1. A estrutura da criação mostra seis dias em duas estruturas de três, onde os primeiros três dias são complementados pelo que foi criado em sequência nos próximos três dias. Desta forma, os luminares no quarto dia providenciam a luz para o primeiro dia; as aves e animais marinhos enchem as águas e ares separados no segundo; e os animais terrestres com o homem preenchem e se alimentam da terra seca e sua vegetação criada no terceiro dia. O sábado é o clímax da criação, onde Deus celebra com toda a criação Sua obras.

Outros detalhes interessantes é que o hebraico de Gênesis 1:16 não usa as palavras sol (shemesh) e lua (hodesh, levanah), mas apenas descreve que Deus criou dois luzeiros, “o maior para governar o dia, e o menor para governar a noite”. Mas, é amplamente reconhecido que esses são o sol e a lua. A possível razão pela qual o escritor de Gênesis não tenha usado os seus nomes foi porque esses substantivos eram conhecidos como deuses pagãos no Oriente Médio da época. E assim, o autor estaria deliberadamente mostrando o poder do Deus de Israel sobre os “outros deuses” pagãos ao criar os seus símbolos apenas no quarto dia.

Outra observação, o autor de Gênesis 1, em sua linguagem, demonstra que ele estava descrevendo algo literal, uma história, não apenas uma estória. A sequência de “tardes e manhãs,” seguidas de numerais, mostra literalidade em hebraico. Outra indicação de sua literalidade é a expressão “estas são as gerações do céu e da terra” (2:4). Essa expressão (Heb.toledot = gerações) é chave no livro de Gênesis. Ela ocorre 13x (2:4; 5:1; 6:9; 10:1,32; 11:10,27; 25:12,13; 25:19; 36:1,9; 37:2), mostrando que todas as histórias são reais e históricas. A criação, Noé, Ismael, Isaque, Esaú e Jacó. E note que a expressão é usada em genealogias, sugerindo que a criação também é uma genealogia.

Gostaria de terminar com uma análise filosófica sobre a crítica contra a literalidade da criação em Gênesis. Primeiro, é importante ressaltar que até mesmo os mais ferozes críticos ateus estudiosos dos escritos bíblicos (os críticos-históricos) afirmam que a intenção do autor de Gênesis 1 é descrever uma criação literal em sete dias consecutivos de vinte e quatro horas, e não algo simbólico. Mas, é claro, eles não acreditam nisso porque não acreditam em Deus. O irônico é que são cristãos que tentam alegorizar o relato de Gênesis.

E qual a causa? Tais cristãos querem “harmonizar” a revelação divina com a revelação da ciência. O problema é que eles entram nessa empreitada com uma hierarquia de autoridade já formada em suas mentes. A ciência é superior à revelação divina demonstrada nas Escrituras sagradas. Assim, eles tentam ler a Bíblia à luz das palavras dos cientistas modernos e não o oposto.

É importante esclarecer que a própria Bíblia afirma que a natureza é uma revelação divina (e.g. Gn.1, Sal.8, 19, Rom.1:18-23). E que quando assim reconhecida, o estudo de ambos não produzem resultados opostos e sim, complementares. A revelação Bíblia também afirma que Deus opera obras aparentemente contra a lógica natural humana. Isso porque não temos a capacidade de descrever tudo o que Deus opera. Até porque a mente foi deturpada pelo pecado (ver Jer.17:9 e II Rs.6:8-23). Veja por exemplo as pragas do Egito, a abertura do Mar Vermelho, o nascimento de Deus em uma virgem, Sua ressurreição após três dias e muitos outros eventos o qual chamamos de milagres.

Desta forma, ignorar o poder de Deus sobre Sua criação é não apenas rejeitar o relato de Gênesis 1 mas também de toda a revelação nas Escrituras. Como cristãos, devemos colocar as Escrituras como suprema revelação divina e à luz dela interpretar todos os outros fenômenos ao nosso redor, reconhecendo que nem todas as coisas explicaremos com uma precisão matemática.