O blog anterior resumiu a questão interpretativa de como indentificar o
chifre pequeno em Dan 8. O debate maior é linguístico e relacionado a origem do
chifre no v.9. Como já vimos, Dan 8:9 apenas diz “de um deles”. Mas a que
esse pronome “deles” se refere? Há diversas sugestões. Os teólogos Adventistas
Gehard Hasel e William Shea argumentam que como esse pronome (Heb.-hem = deles) é masculino ele se refere a
um antecedente masculino, que no v.8 seria os “ventos do céus” (Heb.-ruohot [feminino] hashamaim [masculino]), e não aos chifres (Heb.-qeren [feminino]).
Outros Adventistas historicistas argúem que o pronome (Heb.-hem = deles) pode ser usado tanto no
masculino como no feminino. Martin Proebstle, por exemplo, argumenta que a
construção substantiva construto-absoluto “ventos dos céus” do v.8 é liderada
pelo substantivo feminino e deve ser considerada feminina, caindo em dissonância
com o argumento do gênero masculino de Hasel e Shea. Outro argumento
apresentado por Hasel é que na segunda parte do v.8, a palavra “chifres” (qeren) não aparece no hebraico (“em seu
lugar saíram quatro notáveis”), sugerindo que o pronome do v.9 se refere ao
objeto explicitado anteriormente, os ventos.
Proebstle rejeita essa ideia dizendo que os chifres estão implícitos no
texto e por isso o intérprete não deveria fazer muito caso sobre essa ausência.
No entanto, Hasel afirma que essa ausência é uma forte indicação para entender
a descrição seguinte (v.9) e identificar a procedência do chifre que atacaria
os céus. Apesar de Proebstle argumentar que a sintaxe desses versos pode ser
explicada de outra forma, os argumentos de Shea e Hasel, para mim, continuam válidos.
Isso porque eles afirmam que há um par no final do v.8 que pode ser
considerado como feminino-masculino (ventos dos céus), e no início do v.9 há a
mesma sequência de gênero feminino-masculino (“de um deles” – Heb.- ha’ahat mehen). Para mim, o argumento
mais convincente é ainda o do antecedente mais próximo. Isso ocorre até em
português. O pronome normalmente se refere ao objeto (substantivo) mais próximo
dele. Nesse caso, em Dan 8:8, o mais próximo antecedente é “ventos dos céus”.
Se assim for interpretado, o poder do v.9 não é um dos 4 chifres do v.8 (O
Livro), nem se origina dos quatro poderes/chifres gregos (ARA). A interpretação
preterista que o identifica como Antíoco IV Epifânio então não se coaduna com
o texto e nem com a história. O historicismo, porém, ao enxergar o império Romano
vindo de um dos ventos, faz sentido ao texto e é coerente com as visões
paralelas no livro de Daniel. O chifre vem do ocidente (Roma estava a oeste de
Jerusalém e Babilônia) e se expande “para o sul [Egito], para o oriente
[Iraque; Irã], e para a terra gloriosa [Israel]”(v.9). Antíoco não avançou para
essas regiões descritas na visão, e nem veio do oeste.
E tem mais, como chifres em Daniel simbolizam reis e/ou reinos (7:24, 8:21-23), a interpretação preterista aplicada a Antíoco não faz sentido visto que Antíoco não foi o 5º rei de sua dinastia, nem o 11º se for argumentado a partir dos 10 chifres de Dan 7 que aparecem antes do chifre pequeno. Apenas o Império Romano se encaixa nessas características. Por que é tão importante identificar quem é o chifre que começa pequeno e ataca a Deus? Isso refletiremos no próximo texto.