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sábado, 15 de setembro de 2012

quem é o chifre pequeno? - parte 2


O blog anterior resumiu a questão interpretativa de como indentificar o chifre pequeno em Dan 8. O debate maior é linguístico e relacionado a origem do chifre no v.9. Como já vimos, Dan 8:9 apenas diz “de um deles”. Mas a que esse pronome “deles” se refere? Há diversas sugestões. Os teólogos Adventistas Gehard Hasel e William Shea argumentam que como esse pronome (Heb.-hem = deles) é masculino ele se refere a um antecedente masculino, que no v.8 seria os “ventos do céus” (Heb.-ruohot [feminino] hashamaim [masculino]), e não aos chifres (Heb.-qeren [feminino]).

Outros Adventistas historicistas argúem que o pronome (Heb.-hem = deles) pode ser usado tanto no masculino como no feminino. Martin Proebstle, por exemplo, argumenta que a construção substantiva construto-absoluto “ventos dos céus” do v.8 é liderada pelo substantivo feminino e deve ser considerada feminina, caindo em dissonância com o argumento do gênero masculino de Hasel e Shea. Outro argumento apresentado por Hasel é que na segunda parte do v.8, a palavra “chifres” (qeren) não aparece no hebraico (“em seu lugar saíram quatro notáveis”), sugerindo que o pronome do v.9 se refere ao objeto explicitado anteriormente, os ventos.

Proebstle rejeita essa ideia dizendo que os chifres estão implícitos no texto e por isso o intérprete não deveria fazer muito caso sobre essa ausência. No entanto, Hasel afirma que essa ausência é uma forte indicação para entender a descrição seguinte (v.9) e identificar a procedência do chifre que atacaria os céus. Apesar de Proebstle argumentar que a sintaxe desses versos pode ser explicada de outra forma, os argumentos de Shea e Hasel, para mim, continuam válidos.

Isso porque eles afirmam que há um par no final do v.8 que pode ser considerado como feminino-masculino (ventos dos céus), e no início do v.9 há a mesma sequência de gênero feminino-masculino (“de um deles” – Heb.- ha’ahat mehen). Para mim, o argumento mais convincente é ainda o do antecedente mais próximo. Isso ocorre até em português. O pronome normalmente se refere ao objeto (substantivo) mais próximo dele. Nesse caso, em Dan 8:8, o mais próximo antecedente é “ventos dos céus”.

Se assim for interpretado, o poder do v.9 não é um dos 4 chifres do v.8 (O Livro), nem se origina dos quatro poderes/chifres gregos (ARA). A interpretação preterista que o  identifica como Antíoco IV Epifânio então não se coaduna com o texto e nem com a história. O historicismo, porém, ao enxergar o império Romano vindo de um dos ventos, faz sentido ao texto e é coerente com as visões paralelas no livro de Daniel. O chifre vem do ocidente (Roma estava a oeste de Jerusalém e Babilônia) e se expande “para o sul [Egito], para o oriente [Iraque; Irã], e para a terra gloriosa [Israel]”(v.9). Antíoco não avançou para essas regiões descritas na visão, e nem veio do oeste.

E tem mais, como chifres em Daniel simbolizam reis e/ou reinos (7:24, 8:21-23), a interpretação preterista aplicada a Antíoco não faz sentido visto que Antíoco não foi o 5º rei de sua dinastia, nem o 11º se for argumentado a partir dos 10 chifres de Dan 7 que aparecem antes do chifre pequeno. Apenas o Império Romano se encaixa nessas características. Por que é tão importante identificar quem é o chifre que começa pequeno e ataca a Deus?  Isso refletiremos no próximo texto.

sábado, 8 de setembro de 2012

quem é o chifre pequeno - parte 1


      5)     O cifre “pequeno” origina de um dos 4 chifres ou de um dos 4 ventos? E qual a diferença?(Dan 8:8-9)

Já vimos brevemente que existem interpretações diferentes sobre profecias apocalípticas. Em particular, essa questão em Daniel 8 traz à tona a diferença entre preterismo e historicismo. Enquanto o historicismo interpreta o quarto reino de Dan 7 como o Império Romano em suas duas fases (pagã e papal), o preterismo vê o poder representado pelo chifre que começa pequeno e persegue o povo de Deus como Antíoco IV Epifânio. Um dos maiores argumentos para tal diferença é Dan 8:8,9 sobre a origem do chifre pequeno.

É importante salientar aqui que até as traduções revelam tendências interpretativas sobre a profecia de Daniel. A de João Ferreira de Almeida Revista Atualizada (ARA) traduz o verso 9 da seguinte forma: “de um dos chifres saiu o chifre pequeno”. A João Ferreira de Almeida Atualizada e a Nova Versão Internacional diferentemente traduzem: “de um deles saiu um chifre pequeno”. Outra tradução, O Livro, já diz: “um destes chifres, crescendo devagar a princípio...”

Note que as traduções O Livro e a ARA são interpretações do texto hebraico, pois o v.9 diz apenas “de um deles”, o que as traduções Atualizada (AA) e a NVI mantêm. Mesmo assim, mantendo uma tradução mais literalística do texto hebraico, a questão continua. O que significa “de um deles”? De onde vem o chifre que ataca o céu, Deus e o santuário? Determinar tal poder é importante visto que suas atividades afetam o povo de Deus. Então qual interpretação possui mais evidências textuais e históricas?

Antes de avaliarmos as diferenças interpretativas destaco que tanto o historicismo como o preterismo interpretam Dan 8 num contínuo histórico. Isso porque o próprio anjo na segunda parte do capítulo assim interpreta. O carneiro representa a Média e os Persas (v.20), o bode a Grécia, o chifre notável o seu primeiro rei e os próximos 4 chifre como quatro reinos subsequentes. Então não há dúvidas historicamente que os gregos vieram após os Medo-Persas com um grande rei, Alexandre o Grande, e logo após sua morte o seu império foi dividido entre quatro generais que fundaram quatro sub-impérios (Cassandro, Lisímaco, Ptolomeu e Seleucida).

A diferença entre o preterismo e o historicismo é a relação entre Dan 8:8,9 com o chifre que sai do quarto animal em Dan 7. Como há uma forte relação entre ambas as visões elas devem ser consideradas juntas. Em Dan 7 também há uma descrição de impérios “mundiais” representados por animais/bestas. Eles são visto em sequência representando linearidade histórica. Tanto o leopardo em Dan 7 e o carneiro em Dan 8 possuem quatro protuberâncias (cabeças/asas e chifres). Em seguida, nos dois capítulos, aparece um chifre que cresce para atacar o povo de Deus até o tempo do juízo.

Continuando o paralelismo, nos dois capítulos os poderes crescem em força até atingir a Deus. Grécia foi mais forte que os Medo-Persas, e Roma mais forte que a Grécia. Há uma progressão de poder assim também como uma separação/distinção de reinos. Quando os preteristas identificam o último chifre como Antíoco IV eles não são fiéis à descrição das visões nem a história. Antíoco não possuiu um reino distinto dos gregos (Alexandre o Grande) nem foi maior que o seu fundador. Mas o império Romano foi.

Sobre a distinção de poder, as duas visões possuem uma sequência que sugere essa distinção de poder: “eu vi” + descrição do símbolo + direção + poder. Em Dan 8 essa sequencia distingue o carneiro do bode e em Dan 7 os quatro poderes da Babilônia (leão), Medo-Pérsia (urso), Grécia (leopardo) e Roma (besta espantosa). Porém não há nenhuma visão em Dan 8 para descrever o chifre pequeno no v.9. (Isso foi identificado por Martin Proebstle em sua tese de PhD em Antigo Testamento na Andrews University – Truth and terror). Estaria então os preteristas corretos ao identificarem o v.9 como uma continuação do poder anterior? (continua no próximo post)